Cansadas de gastar dinheiro e não ver o resultado prático das ações de treinamento e desenvolvimento, as companhias apostam em outras formas de ensino
Roseli Loturco
A zootecnista Juliana Pescara, responsável pelo treinamento e desenvolvimento daElanco na América Latina, passou três meses nos Estados Unidos, em 2013, para receber 19 certificações de diferentes cursos sobre como capacitar pessoas. Era uma tentativa para resolver um problema corporativo. A Elanco, divisão de saúde animal da farmacêutica Eli Lilly, sofria do mesmo mal da maioria das empresas: como aprimorar o conhecimento de seu público interno e fazer os milhões investidos todos os anos em desenvolvimento valer a pena?
Segundo o Panorama do Treinamento no Brasil 2015, realizado pela associação brasileira de treinamento, a ABTD, as corporações com mais de 500 funcionários gastam em média 1.385.819 reais com treinamento e desenvolvimento (T&D), o que representa 11% de sua folha de pagamento. A pesquisa, que analisou dados de 425 instituições públicas e privadas, identificou um aumento de 58% no volume de trabalho do profissional de T&D de 2014 para 2015. Contudo, pouquíssimas organizações avaliam o resultado das ações da área — e, quando o fazem, os números são alarmantes. “Só 8% das empresas brasileiras que mais empregam calculam o retorno sobre o investimento feito em treinamentos. Globalmente, esse percentual é de 28%”, afirma Aléssio Tanganelli, diretor para Itália, Espanha e Brasil do Top Employers Institute, instituição holandesa que certifica globalmente as condições criadas por empregadores a seus colaboradores. No que tange à qualidade da formação, a taxa mundial de retenção do conhecimento é de pouco mais de 40%, enquanto no Brasil “apenas 23% do que é passado nas aulas é retido pelo funcionário por longo tempo”, diz Tanganelli.
Uma das causas da baixa retenção do aprendizado está na forma como técnicas e conhecimentos são apresentados em sala de aula. “O cérebro pode ouvir alguém falar por 90 minutos, mas só vai absorver 20 minutos da conversa. Se o professor quiser que o aluno se envolva no conteúdo, precisa reconquistá-lo a cada oito minutos”, explica Juliana, da Elanco. Ao voltar da temporada nos Estados Unidos, a executiva reformulou todos os programas de T&D da multinacional, tanto dos cursos presenciais quanto dos virtuais. Seguiu como princípio básico o conceito daandragogia. “Essa modalidade foi escolhida para melhorar a retenção de conteúdo por parte dos empregados e aumentar a eficácia de sua implantação no dia a dia”, diz a zootecnista.
Andragogia é a arte ou ciência de orientar adultos a aprender, segundo a definição creditada ao educador americano Malcolm Knowles, na década de 1970. O termo remete à educação voltada para o adulto, em contraposição à pedagogia, que se refere à educação de crianças. “Ela é baseada na citação do filósofo chinês Confúcio: ‘Aquilo que escuto eu esqueço. Aquilo que vejo eu lembro. Aquilo que faço eu aprendo’”, explica Juliana. As aulas seguindo a andragogia envolvem instrumentos sensoriais, como massinha e bexigas, além de música, vídeos e brincadeiras para quebrar o gelo inaugural das turmas.
Além desse conceito, a Elanco adotou a técnica dos quatro “is”: envolver (involve, em inglês), entrar (in put, no outro idioma), implementar e integrar — respeitando a teoria dos 90x20x8. Os números se baseiam no tempo de cada ação: ninguém fica sentado por mais de 90 minutos, por 20 recebe um in put de aprendizado e a cada oito minutos o educador envolve o participante usando o terceiro ou o quarto ‘i’.
As novas práticas de ensino começaram em 2013 nas unidades da América Latina e hoje são usadas com os 7.000 funcionários da Elanco globalmente. Um dos resultados práticos medidos pela companhia — que se tornou a segunda maior empresa de saúde animal do mundo com a compra da Novartis, em 2014 — foi a redução pela metade do tempo para fechar novos negócios. “Outro indicador foi a melhora no engajamento de equipes com a liderança”, diz a responsável por treinamento e desenvolvimento.
Assim como a empresa de saúde animal, a fabricante de papel e celulose Suzanotambém utiliza em seus treinamentos instrumentos de percussão, histórias e objetos lúdicos. A necessidade de rever os cursos surgiu a partir de 2013, com a chegada do presidente Walter Schalka. O CEO decidiu levar o conceito de empreendedorismo até as pontas, o que significava estender o poder de decisão aos funcionários de todos os níveis hierárquicos. Para isso funcionar, era preciso alinhamento e confiança — e, obviamente, ensinar pessoas que nunca tomaram decisões a decidir.
Para isso acontecer na prática, Carlos Griner, diretor de recursos humanos da Suzano, decidiu seguir o método do Action Learning para formar os 8.000 empregados da companhia. O processo de desenvolvimento agora passa por discussões estratégicas, durante as quais os alunos trabalham com problemas reais da empresa e precisam apresentar uma solução ao final do curso. “O aprendizado acontece muito mais na prática do que em sala de aula. Trabalhamos com grupos de cinco a oito líderes, de diferentes áreas, para fortalecer a visão do todo e para dar a oportunidade de contribuição às pessoas de departamentos diferentes”, diz Griner.
O modelo, amadurecido em 2014, preparou 75 dos 400 líderes da Suzano para desenvolver grupos com entregas e desafios reais. Um dos resultados obtidos foi a quebra dos silos e das barreiras entre as áreas, o que contribuiu para o sentimento de pertencimento dos funcionários.
O uso de métodos mais práticos e funcionais é uma tendência que tende a se consolidar nos próximos anos. Afinal, a educação corporativa só faz sentido se melhorar a produtividade e o desempenho dos funcionários.
Fonte: http://vocerh.uol.com.br/noticias/acervo/novas-metodologias-para-capacitar-os-funcionarios.phtml